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29 de abr. de 2011

DIFICULTANDO AS COISAS




Sim eu dificulto. Não, eu não sou sádico.

Apenas acredito que é sob as condições mais adversas que os talentos nascem, que as pessoas mostram seu valor. E no terreiro não é diferente, afinal ali são travadas grandes batalhas pelo bem geral que infelizmente não podemos ver e obter maior compreensão. No terreiro vemos apenas a "marionete", o médium sendo controlado pelos espíritos, ouvimos a voz do interlocutor, não a do benfeitor, mas se vamos de coração aberto e com foco no bem a ser praticado podemos sentir o que acontece, as energias fluindo no ambiente.

Como médium eu fui criado na base da porrada, tem ter hora marcada para gira, sem atabaque, sem defumação, sem templo, sem roupa branca, somente a Mãe de Santo, a fé, dois irmãos (hoje padrinho e madrinha da casa) e pessoas que nos recebiam em seus lares. Quando por muito tínhamos uma vela, um copo d'água e uma cadeira como altar. Aprendi a receber as entidades sem precisar da maioria dos fundamentos, apenas com a concentração e fé em Deus, segurávamos a gira no canto e nas palmas por horas a fio sem cansar porque sabíamos da importância do canto e do trabalho que sustentávamos para os orixás presentes. A caridade era feita, isso que importava. O ser em detrimento do ter ou do parecer.

Não que eu ache que os fundamentos de uma casa sejam desnecessários, muito pelo contrário, eles são sim e muito! São a segurança da gira, com eles o risco de acontecer algo grave é muito maior e no templo não abro mão dos fundamentos, mas me esforço em mostrar que não dependemos apenas disso para trabalhar, porque uma hora surgirá uma grande necessidade de iniciar uma sessão num local aparentemente desprotegido e o que o fiel fará? Vai sair correndo? E se a demanda for maior e os fundamentos não forem suficientes? O médium perecerá? Por isso o preparo em condições adversas, para fazer do fiel uma consciência forte, inabalável.

Digo e repito: a coisa mais idiota que já ouvi de um médium foi a frase "Meu guia não vem sem a roupa dele...". O guia não precisa de roupa, precisa de você e de sua fé e concentração para servir como ponte. quanto maior a fé e concentração (equilibrados) mais fluída será a estrada entre o astral e a coroa do médium e mais belo e seguro será o desenrolar da gira. Médiuns que perdem o foco no binômio fé/concentração são aqueles que podem até incorporar de forma bela, mas não tem controle sobre qual espírito se vale de sua coroa (se é bom ou mau) e nem a situação em que cederá seu corpo a um ente do astral, são pessoas assim que vasculham casas de produtos religiosos atrás de imagens com nomes dos orixás, que se deixam levar pela densa aura de um descarrego e penam para voltar a si, são pessoas que vão à gira quando bem entendem ignorando o porque de estarem ali.

Médium bom não é aquele que incorpora bonito, é aquele que se dedica à religião e à caridade.

Axé.

25 de abr. de 2011

VOU SER COBRADO?



A Dinâmica da fidelidade umbandista é algo curioso de se estudar, principalmente porque o grande erro do ingressado é seu foco. A grande maioria dos fiéis que conheço entram para a corrente por causas pessoais, entram por si, na esperança de resolver seus problemas familiares, pessoais e amorosos. Ou pior: acham que estar de branco "do outro lado da cerca" dá status, é bonito de se ver, poderão falar aos amigos que recebem em si espíritos, botarão medo neles...

Entrar para um terreiro é uma demonstração de fé como qualquer outra, a mesma demonstração dos monges, das freiras enclausuradas, dos pastores evangélicos, enfim de todo religioso. O fiel está lá para doar. Para se doar. Ao assumir a condição de médium umbandista a pessoa sela um compromisso com o próximo, com pessoas que nunca viu e possivelmente não verá em muitos anos, o fiel torna-se uma engrenagem numa complexa estrutura que move o mundo rumo aos patamares mais elevados da espiritualidade. A partir do instante em que é tomada a decisão de fazer parte da corrente e iniciar o desenvolvimento mediúnico, os guias espirituais começam a trabalhar no astral para que os necessitados encontrem o caminho até a fonte de caridade  espiritual que vibra na terra através dos templos e de seus médiuns.

É uma decisão muito complicada e deve ser tomada de forma sensata e criteriosa, o fiel deve ser alertado dos procedimentos e das condutas inerentes à nova missão assumida e certamente será cobrado por seus desvios, tanto por seus tutores na terra (Dirigentes Espirituais), quanto por seus mentores astrais.

Este é o grande ruído que impede o pleno progresso da consciência umbandista, o foco dos fieis estão nos benefícios pessoais em se tornarem ferramentas da evolução, pensam que ao ajudar seus problemas serão resolvidos, sendo que ajudar o próximo com vistas aos louros e tesouros frutos dos bens prestados não é caridade. E vale lembrar que Jesus disse "fora da caridade não há salvação".

O resultado disso são fiéis decepcionados com com  o estado estacionário de suas vidas, com a mesmice dentro do terreiro, com o fato de seus amigos não se espantarem mais por sua condição de médium e sua popularidade e status caírem por terra. Com isso o interesse pela religião se reduz e o fiel se afasta da obra e não honra seu compromisso, e todo aquele trabalho realizado no astral para ajudar os sofredores se perde.

Assumimos um compromisso com o mundo. Se somos glorificados pelo bem que fazemos, é compreensível que sejamos cobrados por dar as costas a quem necessita.

Axé.

14 de abr. de 2011

FAZENDO PEDIDOS



Até que ponto devemos reportar aos espíritos o que se passa em nossa vida? Qual o limite para a interferência espiritual em nosso cotidiano? A resposta mais acertada seria não há limites. Isso porque os bons espíritos vem ao nosso plano para nos ajudar em nossas necessidades e iluminar nosso caminho rumo à evolução. O limite em questão deve ser imposto ao fiel, não aos Orixás.

Conheço pessoas que afirmam não dar um passo na vida sem consultar um guia espiritual para saber qual a melhor atitude. Será mesmo necessário? Deus nos deu a capacidade de escolher nosso caminho e colher os louros de nossas vitórias ou amargar as derrotas, tudo com o propósito do aprendizado. A vida me ensinou que são os erros que nos ensinam melhor, porque a consciência humana funciona na base da comparação negativa, ou seja, é necessário perdermos para dar o devido valor ao que um dia tivemos. Se apenas acertarmos, as conquistas não serão tão valorizadas. É o que diz o velho ditado "É preciso chegar ao inferno para se dar conta que esteve no paraíso".

Fora o fato de que acertar vicia e gera comodismo e as consultas que geralmente se iniciam com grandes necessidades de paz, descanso, harmonia, acabam migrando para efêmeros desejos como dinheiro, afastar alguém do caminho e até coisas mais mesquinhas e impróprias que não convém abordar neste texto. O grande mal disso está em tomar o tempo não apenas da entidade, mas sim do próximo que realmente tem problemas mais dignos a resolver. Isso é negligenciar a real caridade, é fazer do egoísmo uma barreira ao progresso do outro.

Cada um tem seu caminho a trilhar com as próprias pernas, assim poderá realmente aprender. Pessoas que consultam as entidades a cada passo que terá de dar, não sentirão o gosto de fazer algo 100% com suas mãos, tornam-se dependentes e cegas aos benefícios das batalhas da vida. E ainda chegam ao cúmulo de culpar os Orixás por algum eventual passo errado que a própria pessoa vier a dar, acusando os bons espíritos por não terem avisado sobre o perigo. Parece um absurdo, mas são coisas que vejo por aí. O ser humano tem como reação ao fracasso o ato de negar-se o ônus da culpa, transferindo-a para quem estiver mais próximo na história, mesmo que seja um amigo espiritual.

O fato de o fiel entrar para a corrente ou simplesmente recorrer a uma entidade de luz sobre seus problemas não significa que nada dará errado. muito pelo contrário, se algo tiver de dar errado, certamente acontecerá, pois os guias espirituais são corrimões  nos guiar no caminho e não escudos que impedirão que algo de ruim aconteça. Se acontecer, reflita, aprenda com o fracasso e ficará bem mais forte. Certa vez Sr. Marabô me disse: "O amor nos dá a base, é o nosso alicerce, ao passo que a dor molda nosso caráter. O que definirá se o fruto da derrota será doce ou amargo é a nossa capacidade de aprender com a queda."

E cá entre nós, errar e aprender é muito mais divertido.

Axé.

8 de abr. de 2011

TÁ FIRME, FILHO?



Acho que nunca ouvi um termo tão amplo e passível de confusão quanto "Firmeza de Cabeça". Há que o ligue a rituais, posturas ou até mesmo um estado de espírito. O chamado estar firme na gira, ou não.

Para mim firmeza de cabeça é um condição do fiel, feita a base de treino. Simples assim. Firmeza de cabeça, trocando em miúdos, é saber abrir e - principalmente - fechar as portas de sua coroa nos momentos certos, evitando constrangimento e até situações perigosas, posto que há no mundo espíritos bons e ruins, tal qual há pessoas boas e ruins também. O médium deve saber o momento certo de receber os bons espíritos e este momento é obviamente em seu templo, sob a supervisão de seu zelador espiritual. fora estas situações eu não aconselho a nenhum médium em desenvolvimento (vale lembrar que estamos TODOS em desenvolvimento) a sair por aí dando vazão aos anseios de incorporar não importando onde esteja. É fato que incorporar é muito bom, nos sentimos em paz e renovados quando o orixá se vai, e fato também que a todo momento alguém necessitado e que sabe de nossa mediunidade aparece pedindo uma consulta ou algo similar e quase sempre ficamos com o coração partido querendo ajudar. Mas há milhares de formas dos espíritos se manifestarem em nossas vidas além da incorporação, pensem nisso.

A habilidade de fechar as portas da coroa é essencial ao bom médium tanto para a sua segurança quanto para a segurança da gira e dos assistidos numa eventual consulta, pois os maus espíritos estão a todo momento circulando a procura de fragilidades das pessoas, como rancor, vaidade e baixa firmeza. Se valem desses defeitos para fazer suas maldades. Caso muito sério.

Por isso digo que mais vale para a força da gira o fiel que custa a receber em si os espíritos por medo destas influências, do que aqueles que esfregam as mãos ávidos incorporar algum espírito sem se preocupar se ele é bom ou não. médium sem firmeza pode até ter um desenvolvimento mais rápido quanto à forma (os guias falam mais, giram menos etc.), mas em relação ao conteúdo eles falham. São os primeiros a cair na gira e também os primeiros a sair dela, enfraquecendo a corrente e deixando-a exposta. 

Por menos que o orixá incorporado fale, mesmo que ele apenas gire, é certo que cabe a ele e aos demais em mesma condição a sustentação da força da gira, garantindo a segurança dos trabalhos, dos passes e das consultas em execução pelos orixás desenvolvidos.

Axé.

4 de abr. de 2011

O DESCARREGO


Lembro-me bem daquela noite, há não sei quantos anos quando Capitão Alemão - marinheiro e porta-voz do terreiro ao qual sirvo - chamou seus méduins de confiança para uma conversa. Ele nos falou sobre o descarrego, algo que para mim até aquele momento era procedimento de igrejas evangélicas, sobre a dinâmica e  seu objetivo maior: aliviar o peso dos fiéis. enquanto a conversa rolava acerca dos benefícios do descarrego, meu amigos e eu esfregávamos as mãos ávidos para aprender algo novo e aumentar a firmeza de nossas coroas. foi então que o assunto migrou para os riscos e a forma como o descarrego por transporte se dava no astral. Tremi.

O descarrego por transporte tal qual praticado no Portal dos Orixás é de forma simplificada um armadilha de eguns. O fiel que está tomado por más influências adentra da gira e fica diante da entidade responsável pelo descarrego (usualmente são os Exús que fazem, mas não há restrição quanto à linha a fazer) que lança energias positivas que desprendem os eguns do fiel e o lançam nos médiuns receptores que estão localizados alguns passos atrás do fiel. Como os receptores são pessoas firmes de cabeça, preparadas mental e espiritualmente, elas se tornam verdadeiras prisões para os espíritos ruins que incorporam nos médiuns e sofrem com o peso do preparo de suas coroas, não conseguindo assim desaparecer no astral em busca de outra pessoa para atormentar. Após serem aprisionadas no corpo no médium, a entidade responsável pelo descarrego vá até o egun incorporado e o recolhe no astral enquanto toca a coroa do receptor, fazendo com que o filho de santo volte ao estado consciente. O egun é então encaminhado para os planos superiores para que possa aprender e continuar na senda da evolução. Caso ele ainda guarde rancor e não queira seguir a luz, permanecerá no limbo sob supervisão de algum Exú.

Esta prática requer basicamente quatro tipos de firmeza: do fiel, do Orixá responsável, dos médiuns receptores e da corrente que observa (demais médiuns e visitantes). Se alguma dessas quatro firmezas não estiverem plenas, há o risco de o mau espírito se fortalecer na gira o que pode acarretar em sérias complicações como alguém da corrente observadora  ou até mesmo o próprio fiel ser dominado por algum egun presente, ou até mesmo os receptores terem seu espírito gravemente afastado de seu corpo físico e acabando por se desdobrar a lugares inóspitos do plano astral. Neste último caso há chances - ainda que raras - de os danos à coroa do médium serem irreversíveis. Por isso sessões de descarrego devem ser feitas por membros coroados do corpo mediúnico e a corrente observadora deve se manter em oração ou cantando em respeito ao trabalho que está sendo executado diante de seus olhos, evitando comentários sobre as manifestações vistas ali, que são, em sua maioria, desagradáveis.

Eu como médium receptor afirmo com toda certeza que o descarrego é um dos procedimentos mais perigosos executados num templo umbandista, requer preparo e concentração pois há uma enorme diferença entre incorporar um ente luminoso que te purifica e receber em si um espírito de baixíssima evolução que tem como único propósito se alimentar do que te faz bem. Sempre volto cansado desses procedimentos, contudo a felicidade do dever cumprido e os bons amigos espirituais me dão ânimo redobrado.

Aprendi muito com descarregos, já viajei no astral e pude entender o sofrimento desses irmãos desgarrados que por ignorância acabam maltratando seus semelhantes. Neste post deixo a minha homenagem e meu agradecimento a todos os irmãos de fé que se arriscam em prol do próximo em momentos como este.

Axé.