Apenas ter fé é o suficiente? |
Olá irmãos, como estão todos?
Quem me conhece ou lê o blog há algum tempo sabe que o terreiro que dirijo fica em Itanhaém-SP, mas grande parte dos membros mora em outras cidades, como São Paulo, e nem sempre podem participar das giras. Quem é umbandista também sabe que é comum em um templo termos uma pequena fração de pessoas altamente engajadas, uma grande porção de membros interessados e outra pequena parte de pessoas que realmente não estão levando a coisa de um modo sério. Se o terreiro for longe como o meu, o número de não-engajados aumenta, se - ainda por cima - houver uma dualidade na administração da casa (o que também acontece conosco), ou seja, há mais de um membro tomando as decisões finais e as visões de como conduzir a casa são quase que dicotômicas, piora mais.
Pois bem, vou contar-lhes uma história. Estávamos todos reunidos em nossa festa de Oxossi (um dos raros momentos em que quase a totalidade dos filhos se reúne) e havia ali uma visível rachadura entre as pessoas: de um lado os filhos assíduos, que nos últimos três anos se dedicaram aos estudos, se esforçavam para ir às giras fizesse chuva ou sol, e de outro estavam as pessoas que eu realmente via apenas em ocasiões sociais ou em grandes festas do templo. De tão visível que era essa disparidade, quem chegasse ali, pensaria que havia dois terreiros na mesma tenta, pois os mais assíduos estavam em um ritmo completamente diferente dos demais. Não que fosse proposital, mas o nível de entrega, concentração e proatividade era tamanho que fazia com que os demais passassem por iniciantes (por mais que alguns tivessem seus 7 anos de desenvolvimento). Enquanto os primeiros cantavam, saudavam e interagiam com a gira de forma respeitosa e coordenada, os demais estavam visivelmente perdidos ou concentrados em coisas que não eram pertinentes para aquele momento.
Após ver aquilo, parei para refletir. Sei que cada um ali tem os seus motivos para ter entrado para o terreiro, confio plenamente na fé de todos em Oxalá e nos demais orixás, mas apenas ter fé e gostar de estar no terreiro é suficiente?
Eu gostaria da opinião de vocês quanto à esta questão, mas a resposta que consegui alcançar foi: não.
Como diz na Prece de Caritas (minha favorita): "Dai-nos a caridade pura, dai-nos a fé e a razão".
E o que é fé? Fé significa acreditar naquilo que não se pode ver, ou seja, é a capacidade de se alinhar com o invisível, com as forças que vão além de nossa compreensão, significa se deixar envolver por um propósito maior, por mais que nosso conhecimento de causa não consiga absorver suas diversas nuances.
A razão, em seu sentido de racionalidade e não de estar certo, nos impele a buscar esse conhecimento que nos falta na fé, as elevar a nossa mente até onde foi nosso coração. A razão nos impulsiona às melhores práticas a ter foco no que realmente interessa em tudo isso, que é a caridade, que é a disciplina e o empenho.
Não basta amar os orixás, é preciso se doar à gira, ter foco no que interessa, ser disciplinado e constante. Isso porque um terreiro é um organismo vivo, mutável e evolutivo, ou seja, uma gira nunca é igual à outra e se você perder seu foco, ficará para trás. Por isso tenham cuidado, meus irmãos, estejam sempre alinhados e presentes no templo que escolheram para habitar, afinal ele é a sua casa e casa abandonada nunca é bom.
Axé!