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28 de jun. de 2011

SIMPLICIDADE




Não me lembro da última vez que li um jornal de Umbanda, deve ter sido há uns dois anos atrás ou até menos. Fato é que assim que o abri fui tendo uma decepção atrás da outra, não apenas pela quantidade assustadora de anúncios que poluíam mais da metade do periódico, mas sim pela exagerada complexidade dos temas tanto dos anúncios quanto das matérias e artigos. As propagandas eram em sua maioria de cursos como "Tipologia dos símbolos ritualísticos da Nonagésima egrégora sagrada do santíssimo mistério umbandista" e "Magia transcendental da chama divina", ou anúncios de livros do tipo "Umbanda e a proto-síntese cósmica", enquanto os artigos giravam sobre temas como "As novas Sete Linhas de Umbanda em relação às espadas mágicas e os tronos do poder" e relatos auto-promocionais todos eles sobre as mesmas pessoas de toda edição seja do JUCA ou Jornal Umbanda Sagrada: Rubens Saraceni, SOUESP, FUGABC, Pai Varela, Alexandre Cumino etc. Eles escrevendo uns sobre os outros ou falando de si mesmos. São as celebridades da Umbanda. Todos eles com grandes escolas, ministrando cursos e formando Babalorixás, sempre com seu tom cada vez menos simplista.

Certa vez me dignei a comprar alguns livros sobre Umbanda para tentar ficar mais a par das novas tendências da religião. Comprei livros teóricos como "As Sete Linhas de Umbanda" e romances psicografados como "O Guardião da Meia-Noite", "O aprendiz Sete" e "O Cavaleiro da Estrela-Guia", todos de autoria de Rubens Saraceni. Cheguei à conclusão de que os livros de teoria não passavam de um vasto emaranhado de gráficos e teses numa tentativa frustrada de criar algum padrão na bela imperfeição e falta de lógica da evolução espiritual já abordada anteriormente neste blog e lançar uma nuvem de inconsistência sobre a visão simples da Umbanda e fazer com que seu repertório obscuro de tese seja aplaudido pelos leigos mais acanhados, na medida em que os romances de tão fantasiosos me levaram a crer que o autor adora jogos de RPG ou leu obras como "Drácula" e "Senhor dos Anéis" em demasia.

O que mais gosto na Umbanda e exatamente o contrário proposto por esse corrente graúda e, felizmente, ainda não majoritária: a simplicidade com que as coisas acontecem. como umas poucas palavras são capazes de tocar fundo no coração de alguém que precise, como uns poucos elementos fazem a diferença - o caso de uma simples vela acesa, defumar o ambiente, tocar os atabaques - e a sua faculdade agregadora e ao mesmo tempo minimalista. Isso é tão lindo e me dói saber que há o risco de se perder.

Não sou do tipo que prega a queima de livros, mas me esforço muito para que os fiéis busquem os ensinamentos diretamente na fonte mais confiável: os Orixás vivos dentro de si. É difícil extrair conhecimento das coisas simples da vida e mais cômodo ler e absorver informação já digerida por outros, contudo é mais recompensador olhar uma situação e refletir sobre ela, ter sua mente e espírito iluminado pelo conhecimento em formação.

Em tempo: confesso que no momento que alguém me afirmou que o Rubens é o Papa da Umbanda, falei um palavrão.


Axé!

17 de jun. de 2011

TROCANDO AS GUIAS



Amanhã celebraremos Xangô, o Orixá da justiça, do equilíbrio entre o que é devedor e o que é credor. Confesso que morro de medo dele e do que ele representa, porque não sou hipócrita ao ponto de dizer que mereço tudo o que tenho, que a vida é justa comigo. Muito pelo contrário: acho que Zambi - Deus, Alá, O Universo, GADU etc. - foi bem generoso comigo nos últimos anos. Mas isso é outro assunto...

Fato é que apesar de meu medo, pelo posto que me foi outorgado Xangô se faz presente ao meu lado. Afinal de contas sou eu que devo arbitrar sobre as divergências na casa, apaziguá-las e manter o templo em ordem, dando a quem merece e cobrando de quem deve. É duro isso, exige de mim maturidade que eu mesmo pensava não ter.

Um dos temas mais delicados que cercam minha tarefa é a transição dos fios de conta (guias), pois em nossa casa elas representam o preparo mediúnico do fiel. Esta graduação vai das miçangas mais finas (miçanguinhas), passando pelas miçangas grossas, contas de porcelana, de cristal, brajás de três fios (nível de padrinhagem) e de sete fios (para chefes de terreiro). esta transição deve ser pautada pela meritocracia, não por motivos políticos, contudo é no momento em que um irmão alcança um grau elevado que outros começam a questionar sobre o tempo de casa, proximidade dele com membros da padrinhagem etc. A nuvem da desconfiança nubla o ambiente e as conversinhas maliciosas começam a dominar a cozinha do templo e os encontros sociais entre membros da corrente fora dos dias de gira. Com isso mais uma vez o foco exigido do fiel é desvirtuado, me deixando pasmo como um adorno colorido pode causar tamanha discórdia.

Graças a esse fenômeno que não é raro nos templos, resolvi cessara as transições momentaneamente, impondo um grau de exigência muito maior para a graduação. Com a paralisação a esperança é que a moda de trocar de guias passe e o foco no imaterial volte, que todos lembrem que são irmãos e iguais perante Zambi. E que aumentar de guia não significa status, significa que quando a dificultade se fazer presente o graduado será cobrado antes dos outros, que ele ganhará menos afagos pois terá a obrigação de evoluir sua consciência e se tornar um distribuidor de carinhos a quem necessita.

Uma guia maior é um voto de confiança, é mais uma página do contrato que assinamos ao entrar para um terreiro. Mais cláusulas, mais cobranças.

Sinto falta de minhas guias finas, minhas costas doíam menos...

Axé.

6 de jun. de 2011

NÃO SOU ESCRAVO



Umbanda é doação, claro, mas qual o limite disso? Doar é caridade e fora da caridade não há salvação, contudo precisamos mensurar o que doamos e qual o teor de beneficência dessas doações. ao fazermos algo pelo próximo ele se tornará agradecido e mais feliz e tão logo precise vai retornar à fonte de caridade. Isso se  essa caridade não não for construtivista - fato mais comum.

Caridade construtiva é aquela que ensina uma lição, que dá motivação transformadora ao necessitado e o ajuda a vencer as provações. O intuito disso tudo é criar auto suficiência da pessoa, é a velha história de ensinar a pescar, em vez de dar o peixe. Já comentei em outro post sobre pessoas viciadas em pedidos e consultas e o mal que geram a si. Também já falei várias vezes que minha Mãe de Santo está de certa forma licenciada da casa por motivos de agenda. Acontece que nos últimos dias pessoas foram até ela vociferar, intimá-la voltar para o terreiro pois precisavam falar com um ou mais Orixás que nela aportam. Achei aquilo um crime, uma ingratidão sem tamanho e ato e horrenda mesquinhez, pessoas que não se importam com as necessidades dos outros, que tem visão fixada apenas em si e em suas vontades, que não tiveram a mínima sensibilidade para notar que o Orixá necessita de um corpo físico para incorporar e que essa pessoa - esse médium - pode ter uma infinidade de problemas durante sua vida. A coisa mais normal do mundo. Todavia alguns desses problemas podem impedi-lo temporariamente de praticar a incorporação, mas JAMAIS a caridade.

Fiquei pensando se eu aguentaria ver e ouvir certas coisas de pessoas que amo, das pessoas pelas quais jurei me dedicar. Provavelmente eu começaria a pesar o merecimento de cada uma em relação ao tempo que dedico ao desenvolvimento mediúnico - prática da qual eles são os grandes beneficiários. Não que eu me ache no direito de regular quanto tempo cada um pode passar em consulta com uma entidade, mas isso é uma questão de soberania de minha pessoa sobre a minha própria vida e todo o resto do mundo, tenho o direito de decidir que tempo posso dedicar à vida de dirigente de terreiro, aos meus problemas pessoais, à minha vida profissional, faculdade, família etc. Seria inadmissível alguém chegar até mim e me julgar por eu não incorporar na hora que todos desejam. Se Deus quisesse que algum Orixá ficasse com o poder do meu corpo a todo instante, Ele teria ordenado que esse Orixá encarnasse em meu lugar, não é verdade? Temos muito mais o que fazer em sã consciência do que em transe.

Posso incorporar sim, mas somente no terreiro. O Portal dos Orixás abre as suas portas a cada 21 dias das 20:30 em diante, nesse período sou todo de vocês.

Axé.